sábado, 4 de setembro de 2010

Kombeiros são absolvidos

Era pouco mais de meia-noite de hoje. Quem estava dentro do lotado Fórum de Ipojuca tinha o coração batendo acelerado. Todos queriam saber o resultado do julgamento mais importante da década. Seriam os kombeiros Marcelo e Valfrido Lira absolvidos ou condenados? Sete anos de perguntas foram caladas. Pelo menos, por enquanto. Um júri apertado, de 4 a 3, mas que absolveu os réus, que até hoje se diziam inocentes dos assassinatos das adolescentes Maria Eduarda e Tarsila Gusmão, em maio de 2003. Marcelo e Valfrido estão livres e agora podem voltar para casa.

Arrumar os pertences do Centro de Observação e Triagem Professor Everardo Luna (Cotel) e sair da prisão onde estavam há dois anos e sete meses. Uma semana de julgamento, mais de sessenta horas, e os fogos na frente do fórum eram o sinal de felicidade de parte da população de Ipojuca e distritos vizinhos que torciam pelos réus. Ainda na madrugada de hoje, familiares e amigos dos irmáos prepararam uma festa para recepcioná-los em casa. Os promotores já anunciaram que vão entrar com recurso de apelação para um novo julgamento.

Marcelo e Valfrido foram inocentados da acusação de homicídio duplamente qualificado e tentativa de estupro pelo conselho de sentença, formado por quatro homens e três mulheres, todos de Nossa Senhora do Ó e Camela. "A verdade chegou", bradou Marcelo. "A justiça foi feita", acrescentou Valfrido, ainda se levantando das cadeiras onde estavam e de onde assistiram todo o julgamento sem demonstrar emocao. Perto dali, Paulo Lira da Silva, 20 anos, colocava a mão no peito. Ele é filho de Valfrido e desde a última segunda-feira acompanhou o julgamento do próprio pai. "Tinha certeza de que isso ia acontecer, de que ele não era culpado. Meu pai não tem capacidade para isso. Tem uma filha que tem a mesma idade que as meninas teriam agora se estivessem vivas", desabafou. Do lado da família das vítimas, Regina Lacerda, que não participou da parte final do julgamento, já anunciou: vai mandar celebrar por trinta meses uma missa em agradecimento à absolviçãodos réus. Ela era a única entre os pais das vítimas que acreditava na inocencia dos kombeiros.

O advogado Jorge Wellington de Lima, que defende os irmãos desde abril deste ano, acredita que os depoimentos dos peritos foram cruciais para a defesa. "Quem absolveu eles foram os peritos do Instituto de Criminalística de Pernambuco. Foram eles que, do auto de suas competências, que esclareceram as dúvida. Os peritos levaram à prova da inocência. Dedico a vitória aos irmãos Lira e ao amado professor Miguel Sales", comemorou. Ele foi aluno do promotor aposentado em Caruaru e virou seu discípulo.

O placar apertado do julgamento foi visto como um bom sinal pelos promotores que passaram os últimos dias tentando condenar os kombeiros. "É importante destacar a divergência do júri. A votação mostrou a consistência dos nossos argumentos", destacou o promotor Salomão Abdo. Na opinião dele, o que pesou contra a acusação foi a questão geográfica. "Alertamos para o fato dos jurados morarem em Camela e Nossa Senhora do Ó no pedido de desaforamento", destacou Abdo.

A partir de agora, a acusação entra com recurso de apelação para novo julgamento. Para isso, é necessário esperar que todo material gravado em plenário seja taquigrafado, para que sejam dadas vistas. A partir daí os promotores e advogados da assistência da promotoria apresentam suas razões e defesa se manifesta. Só então o pedido segue para avaliação do Tribunal de Justiça de Pernambuco.

Enquanto a assistência baseará o recurso por nulidade do julgamento no fato do advogado Bruno Santos, da defesa, ter se constituído primeiro como advogado de Regina Lacerda e depois passar para o lado dos kombeiros justificaria o pedido. Já a promotoria apelará com base na decisão contrária à prova dos autos. "Temos como reverter essa situação", garantiu o promotor Ricardo Lapenda.

Marcelo Lira fala sobre os dias na cadeia: